CINEMA - LANO ANDRADO - CACÁ DIEGUES, UM BRASILEIRO

 CINEMA


CACÁ DIEGUES, UM BRASILEIRO

      Semana passada (14/02) perdemos o grande diretor Cacá Diegues, um dos fundadores do Cinema Novo. Cacá talvez seja conhecido por obras como Tieta do Agreste, Orfeu, Bye Bye Brasil, Xica da Silva e Deus É Brasileiro, mas seu legado vai muito além disso.

      Em 1964 ele dirigiu o longa-metragem Ganga Zumba, que conta a história do líder do Quilombo dos Palmeiras. O filme conta com a participação do mestre do samba Cartola e trilha sonora interpretada por Nara Leão, com que Cacá viria a se casar anos depois.

      Trabalhos como Um Trem Para As Estrelas, Chuvas de Verão e O Maior Amor do Mundo também merecem a atenção do público brasileiro. Cacá também dirigiu curtas-metragens como Receita de Futebol, Brasília, Batalha da Alimentação, Domingo, Cinema Íris entre outros.

      Em 1990 Cacá dirigiu o videoclipe Exército de Um Homem Só, da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii. Seu último filme foi lançado em 2018, o Grande Circo Místico, que tentou uma vaga no Oscar, mas ficou de fora.

      Cacá Diegues foi um direito ousado e inovador. Foi ele que criou a expressão "patrulhas ideológicas" e comprou muitas brigas com a esquerda no final dos anos 70.

      Em entrevista para a revista Época, Cacá disse que estava vivendo a fase Cacazinho paz e amor e que havia perdido o interesse em discussões políticas. Sobre as críticas que o filme Xica da Silva teve na época, Cacá respondeu de forma genial:

"As pessoas não acreditavam que os escravos, os oprimidos, podiam ter individualidade. Eles têm individualidade. Têm seus desejos. Não vivem só de ideologia. Às vezes, as pessoas confundem o amor pelo miserável com o amor pela miséria. Não é meu caso."

      Sobre a criação da expressão "patrulhas ideológicas", Cacá disse:

"Naquela época, havia quem insistisse numa espécie de censura ideológica à produção cultural. Estavam muito preocupados em dividir o mundo entre o bem e o mal. Isso era resultado da Guerra Fria. Eu era contra isso, como sou até hoje. O artista não pode ser um intelectual orgânico, do partido, e colocar a ideologia acima de sua criação. Criei a expressão patrulhas ideológicas em homenagem a essas críticas."

      E para fechar essa nossa singela homenagem ao mestre Cacá Diegues, coloco aqui esse trecho que mostra o quanto Cacá era necessário:

"Todo mundo tem o direito de fazer o filme que bem entender. Agora, o filme tem de ser bom, independentemente de ser de direita ou de esquerda, porque traz coisas novas, encanta, faz pensar. A disputa ideológica e cultural faz parte da democracia. Se você não admitir que seu contrário tenha pelo menos 5% de razão, sua atitude está errada."

      Parabéns, Cacá Diegues! E obrigado por nos mostrar o nosso país de todas as maneiras que ele se manifesta e por fazer isso sem abrir mão da arte.

Nos primórdios da MTV Brasil: Making Of do videoclipe O Exército de Um Homem Só com depoimentos de Humberto Gessinger, Carlos Maltz, Augusto Licks e Cacá Diegues.



Lano Andrado

Lano Andrado é escritor/roteirista, autor dos livros As Quatro Cartas de Camila,
Mesmo Que o Sol se Demore e A Divina Democracia. Foi roteirista do programa Plano Sequência,
da TV Escola, dirigido e apresentado pelo ator/diretor Carlos Vereza.
Ficou em terceiro lugar no V Prêmio Clube dos Autores, com o romance As Quatro Cartas de Camila.
Escreveu e dirigiu o curta-metragem O Vinho Que Bebi Sozinho e o Documentário Shangri-lá e Sua História.


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